sábado, 25 de janeiro de 2014

Resenha da obra “Cinema e História” de Marc Ferro

Por Douglas Barraqui


“Cinema e História” é um livro do historiador francês Marc Ferro. Trata-se de uma das obras singulares e, em até certo grau inaugural, do campo dos estudos da relação entre o cinema e a história. Nesta obra o autor nos mostra de que maneira há uma inter-relação entre as produções cinematográficas e a história.
O livro é dividido em catorze capítulos em que Marc Ferro analisa o processo de produção de filmes e a influencia política e social que eles culminaram. Para isso o autor usa como exemplo filmes como: “O Encouraçado Potemkin”, “O judeu Suss”, “A grande ilusão”, “M - o vampiro de Dusseldorf”, “O terceiro homem”, entre outros.
No Capítulo I – “coordenadas para uma pesquisa” – o autor vai nos dizer que entre o cinema e a história as interferências são múltiplas. Desde quando o cinema se tornou uma arte, ele foi usado para intervir na história. Com os avanços tecnológicos, como advento da câmera super 8, o cinema se tornou muito mais ativo como agente de uma tomada de consciência social. “Medir ou avaliar a ação exercida pelo cinema é difícil”, nos diz Marc Ferro.
A intervenção do cinema é exercida por meio de um certo número de modos de ação que faz do filme uma ferramenta eficaz, e seria ilusão imaginar que essa prática cinematográfica é inocente. “Assim como toda produção cultural, toda a ação política, toda indústria, todo filme tem uma história que é História, com sua rede de relações pessoais, seu estatuto dos objetos e dos homens, onde privilégios e trabalho pesados, hierarquias e honras, encontram-se regulamentados [...]”
Neste capítulo primeiro, portanto, Marc Ferro quer nos mostrar em que pontos o cinema promove sua interveção, eixos a serem seguidos para quem se interroga sobre a inter-relação entre cinema e história: 1. Inicialmente como agente histórico; 2. Por um certo número de modos de ação que torna o filme eficaz e operatório; 3. Pela utilização e a prática de modos de escrita específicas o filme se torna uma arma de combate; e 4. Leitura histórica do filme e leitura cinematográfica da história.
No capítulo II – “O Cinema, agente da história” – Marc Ferro analisa uma filmagem de oito minutos de um campo de concentração para presos políticos na União Soviética. Embora os soviéticos tenham classificado o filme como uma falsificação grosseira, segundo o autor, pelas características da filmagem, tratava-se de um curta realizado para testemunhar.
No capítulo III – “O poder soviético e o cinema” – “O cinema é um instrumento que se impõe por si mesmo, é o melhor instrumento de propaganda. ‘apoderar-se’ do cinema, ‘controlá-lo’, ‘dominá-lo’, essas são expressões encontradas constantemente em Trotski, Lenin, Lunatcharski. [...] ‘O cinema deve ser um contraponto para os atrativos do álcool, da religião, (...) a sala de cinema deve substituir o boteco e a igreja, deve ser um suporte para educação das massas.’”  Segundo Marc ferro, de fato, e originalmente era o que defendiam esses dirigentes soviéticos e eles não deixaram de perceber a importância do cinema. Porém, vai nos dizer Ferro, esse cinema não deixou de ser autônomo.
Capítulo IV – “Sobre o antinazismo americano (1939-1943)” – neste capítulo o autor destaca que enquanto a França não havia uma decisão certa de quem era o inimigo, se era o nazismo ou o comunismo, nos EUA o inimigo já era certo, mesmo antes de 1939. Quando declarada a guerra Roosevelt deu instruções para uma produção cinematográfica voltada para a glorificação e exaltação dos valores americanos. Marc Ferro destaca ainda que um estudo sobre a ideologia americana através do cinema, nos anos de guerra, deveria se concentrar em certos grupos de filmes como: filmes antinazistas, filmes antijaponeses, os grande sucessos de bilheteria, filmes que justificavam a aliança com a União Sociética e filmes realizados por ex-comunistas.
Capítulo V – “Existe um cinema antimilitarista?”
Marc Ferro vai nos dizer que os filmes antimiritaristas, frequentimente paródicos ou marginais, abordam a singularidade do militarismo: o espírito militar, o ridículo e a ingenuidade dos seus dogmas. Uma outra tradição estigmatiza os excessos da disciplina militar. O autor elabora sua análise a partir de filmes como: “sem novidade no front”, “morte sem glória”, “a um passo da eternidade”, “King and Country” entre outros.
Capitulo VI – “As funções encadeadas de o judeu Süss
Neste capítulo Marc Ferro analisa o filme "O Judeu Süss", de Veit Harlan. Filme que foi lançado no Festival de Veneza em 1940. O filme oferecia tudo o que a propaganda nazista desejava: técnica apurada, uma história melodramática de amor e uma orientação antissemita – Veit Harlan sempre negou que tivesse querido fazer um filme anti-semita.
Segundo Marc Ferro no filme há quatro funções bem encadeadas nesse filme que fomentam um condensado da doutrina nazista: 1º quando a câmera deixa o emblema do duque e se dirigi para o emblema hebraico, pendurado em uma loja do gueto; quando Süss se barbeia para visitar o duque, a fusão mostra  a transformação do seu rosto e dos seus trajes;  3º quando Süss despeja sobre a escrivaninha do duque as moedas de ouro que se metamorfoseiam em bailarinas, e 4º quando condenado e encarcerado Süss retoma seu semblante de outrora. O que está implícito nestas quatro funções é que o judeu tem duas caras: a do gueto, que não engana sobre sua natureza subumana e a da cidade, que ilude pela aparência, mas nem por isso é menos nocivo.
Capítulo VII – “Sobre a entrevista em Ophuls, Harris e Sedouy”
Le Chagrin et la Pitié é um documentário franco-suiço produzido por Marcel Ophüls, André Harris e Sedouy, e esta obra marca uma espécie de Revolução de Outubro: por um lado pela sua repercussão, sem dúvida ligada ao tema do filme, por outro lado pela sua orientação. Este documentário suscitou uma agitação variável segundo a ideologia do espectador. Para Marc Ferro, esse sucesso se deve sem dúvida às qualidades  excepcionais da realização do filme. O que, segundo Marc, não foi suficientemente observado. Na verdade os autores teriam utilizados um procedimento antigo, porém, de uma nova maneira: as entrevistas.
Capítulo VIII – “Um combate no filme O Terceiro Homem”
O Terceiro Homem é um dos filmes que marca um movimento que viria a posterior se transformar em uma onda cinematográfica. Trata-se de um filme rodado nos esgotos de Viena ocupada e dividida. O filme romantiza a partilha da Europa no pós-guerra e ao mesmo tempo revelou a crueldade dos agentes clandestinos que estavam na cidade. Marc Ferro, ao analisar o filme, descreve essa tragédia política, escrita no contexto espiritual da Guerra fria. Tratava-se de uma obra anticomunista, embora, nem sempre explicitada, portanto, bem realizada, nos diz Marc Ferro.
Capítulo IX – “Dupla acolhida para A Grande Ilusão”
A Grande Ilusão, nos diz Marc Ferro, terá uma “dupla acolhida”:  o filme mostrava uma realidade da história que não estava na luta entre as nações, mas sim na luta de classes, e logo, a guerra não deveria ter razão de ser; todavia, outras interpretações sobre o filme, mostram que seu conteúdo não deixa de ser ambíguo.
Capítulo X – “Sobre três maneiras de escrever a história”
Nos diz Marc Ferro: “O historiador tem por função primeira restituir à sociedade a História da qual os aparelhos institucionais a despossuíram. Interrogar a sociedade, pôr-se à sua escuta, esse é em minha opinião o primeiro dever do historiador.”
Marc Ferro diz que Em lugar de se contentar com o utilização de arquivos, o historiador deveria antes de tudo criá-los e contribuir para a sua constituição: filmar, interrogar aqueles que jamais têm direito à fala, que não podem dar seu testemunho. O historiador, nos diz o autor, tem por dever despossuir os aparelhos do monopólio que eles atribuíram a si próprios e que fazem com que sejam a única fonte da história. Não satisfeitos em dominar a sociedade, esses aparelhos (governos, partidos políticos, Igrejas ou sindicatos) acreditam ser sua consciência. “O historiador deve ajudar a sociedade a tomar consciência dessa mistificação.”
Capítulo XI – “O filme:  uma contra-análise da sociedade?”
“Seria o filme um documento indesejável para o historiador? [...] o filme não faz parte do instrumento mental do historiador”, é o que nos diz Marc Ferro: na verdade “o cinema ainda não era nascido quando a historia se constituía, aperfeiçoou seus métodos.”
No começo do século XX era visto, pelos”espíritos superiores”, como uma “máquina de idiotilização e de dissolução, um passatempo de iletrados, de criaturas miseráveis exploradas por seu trabalho”.
A própria noção de tempo histórico mudou, o trabalho do historiador mudou e a história se transformou e o filme continua na porta do laboratório.
Capítulo XII – “Ficção e realidade no cinema: uma greve na antiga Rússia”
Neste capítulo Marc Ferro destaca Alexandre Nevski e Andrei Rublev, obras primas que foram capazes de reproduzir o passado de uma forma “exemplar”. Ferro destaca que os filmes cuja ação é contemporânea das filmagens não constituem apenas um testemunho do imaginário da época, eles conseguem também transmitir até nós a imagem real do passado. E vai nos dizer Ferro, isso também serve para as obras de ficção.
Capítulo XIII – “tchapaiev: a ideologia stalinista através de um filme”
Marc Ferro analisa o filme Tchapaiev, de 1934, que, sob a aparência de um filme que fazia a apologia do regime, "revelou os traços profundamente tradicionalistas da ideologia stalinista".
Capítulo XIV – “Lenda e história: o encouraçado Potemkin”
Mark Ferro analisa o filme “O Encouraçado Potemkin” de Sergei Eisenstein, de 1925. Ferro considera essa obra como fruto de seu tempo, de uma ideologia e que possui uma relação temporal peculiar com o próprio argumento contido no filme.  Trata-se de um filme carregado de ideologia, um filme revolucionário e sua justificativa acaba sendo coerente com seu tempo histórico. Ferro considera que a pouca distância entre o tempo do filme e o tempo de sua idealização garante uma qualidade maior e uma fidelidade histórica também maior.
Conclusão
Marc Ferro, portanto, se tornou um pioneiro e, ao mesmo tempo, uma referência dentro do universo da historiografia do que podemos chamar de relação cinema/história. O livro Cinema e História é uma contribuição impar para o campo da historiografia, e coloca Ferro no hall dos grandes historiadores da atualidade.
Fecho essa conclusão com um trecho do livro: “[...] analisar no filme tanto a narrativa quanto o cenário, a escritura, as relações do filme com aquilo que não é filme: o autor, a produção, o público, a crítica, o regime de governo. Só assim se pode chegar à compreensão não apenas da obra, mas também da realidade que ela representa.”
Referência


FERRO, Marc. Cinema e História. Tradução Flavia Nascimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/31796658/Marc-Ferro-Cinema-e-Historia. Acesso em 08 de março de 2013.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Arquitetura Egípcia


Para meus caros leitores e queridos alunos hoje separei algumas páginas da revista "Egito" da editora escala. A revista não trouxe em suas páginas uma grande discussão sobre o tema, mas sim informações que, mesmo factuais e pormenorizadas, são interessantes para construção do conhecimento histórico.





FONTE: EGITO: RELIGIÃO E SOCIEDADE. EDITORA ESCALA. ANO ?