segunda-feira, 5 de setembro de 2016

A CENA E O PRANDIUM


Entre os hábitos cotidianos dos romanos estavam a cena e o prandium, duas maneiras de realizar as refeições que retratavam, respectivamente, a importância dada ao lazer e às atividades militares e políticas.

“Os romanos conheciam dois tipos de refeições opostas, a cena e o prandium. A primeira reunia homens, sempre deitados (quando há mulheres, elas, tradicionalmente, ficam sentadas) em um lugar coberto – casa, pórtico ou jardim coberto (…); um grupo social bem definido – família, clientela, amigos da mesma idade, corporação profissional ou sacerdotal, vizinhos – partilha os prazeres da mesa por ocasião de uma festa. O número de convivas é limitado a uma dezena, mas o número de salas de jantar pode-se multiplicar. Mesmo que os banqueteadores se limitem aos habitantes de uma quinta – um camponês, sua mulher, seus filhos, suas noras, seus netos, alguns criados –, a cena, de qualquer maneira, é uma festa, apesar do pouco luxo; ela é sempre uma ocasião especial.

(…) Mas o romano geralmente come apenas o bastante para se restaurar, sem cerimônia, frequentemente só, não importando onde e quando. Porém, ele não consome qualquer coisa: come apenas alimentos revigorantes, ‘frugais’, compostos de fruges. Este é o prandium.

Assim, o dia do romano não é regulado pelo horário das refeições, uma vez que o alimento indispensável é consumido quando ele sente necessidade, e os banquetes constituem eventos especiais. Em compensação, a oposição entre cena e prandium inscreve-se nas oposições de tempo e de espaço preexistentes.

A cena pertence ao tempo do otium, ou seja, do lazer e da paz. O otium romano implica duas formas de vacuidade. O otiusus não é um guerreiro, o otiusus não está engajado em uma atividade cívica. Uma cena, geralmente, acontece numa tarde de inverno, na sala de jantar de uma casa de Roma ou de uma quinta do campo romano; reúne, durante duas ou três horas, homens lavados, sossegados, vestidos com togas ou túnicas largas, esquecidos das preocupações com a labuta da manhã. O banquete termina ao cair da noite.

Em compensação, o prandium é a única refeição dos romanos engajados na guerra, na atividade política ou em qualquer outra que requeira esforço (labores). Ele pode consistir em um desjejum matinal, uma refeição leve em torno do meio-dia, mas não tem nada de obrigatório. É, também, o jantar do solitário e do soldado em campanha, a única refeição das famílias enlutadas. (…)”

REFERÊNCIA:

FLANDRIN, Jean-Louis; MONTANARI, Massimo. História da alimentação. 4. ed. São Paulo: Estação Liberdade, 1998.

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