domingo, 21 de outubro de 2012

O Brasil parou



O Brasil parou nesta última sexta feira, dia 18 de outubro, para assistir o último capítulo da tele novela da Rede Globo “Avenida Brasil”, obra de João Emanuel Carneiro:
  • O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) calculou que o consumo de energia no horário de "Avenida Brasil" aumentaria 5% e por isso teve que dispor de um plano operacional para solucionar qualquer emergência de possíveis quedas e apagões.
  • Em muitos locais de São Paulo e Rio de Janeiro, as ruas habitualmente cheias de automóveis e pessoas ficaram vazias, como se fosse uma final de Copa do Mundo, com direito a transmissão “ao vivo” pelo Globo-Cop registrando o fato.
  • Bares e restaurantes disputaram clientes com promoções anunciadas durante toda a semana que tinham como gancho principal a transmissão da novela da "Rede Globo" em telões montados especialmente para a ocasião.
  • Em um comício do PT, na cidade de Santo André, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que terminaria seu discurso antes da hora "para que os homens e as mulheres possam ir para casa ajudar o Tufão, que foi sequestrado".
  • E, em São Paulo, a propaganda eleitoral do candidato José Serra (PSDB), que disputará em 28 de outubro o segundo turno do pleito contra o petista Fernando Haddad, incluiu nesta sexta-feira a inserção de uma eleitora que perguntava "Quem matou a Max?", um dos enigmas do final da novela.

Mas, o que há em “Avenida Brasil” que parou o Brasil? Em minha opinião, olhando com as lentes da história, “Avenida Brasil” foi uma novela deturpadora de antigos paradigmas e que rompeu com preceitos e valores da nossa sociedade. O enredo da novela apresentou a vingança como tema principal e, em até certo ponto, positivo; inovou por romper com o maniqueísmo (vilã e mocinha) por vezes o telespectador se perguntava, Nina ou Carminha, quem é a vilã. A novela apresentou a bigamia, no caso do enredo da novela uma “trigamia”, como um fato positivo e engraçado e a traição como algo normal e descontraído. Seria essa a formula para parar o Brasil?

Corrupção, pessoas morrendo em leitos de hospitais, violência calamitosa, educação precária (professores mal remunerados), drogas (mal que atinge a juventude) e o que parou o Brasil foi uma telenovela. Isso poderia até servir de enredo para uma telenovela, mas provavelmente não daria audiência.

Alguns doutores e especialistas em dramaturgia podem até defender “Avenida Brasil”: “A novela acertou em cheio ao trazer como pano de fundo os novos contextos sociais do Brasil. Ao ambientar seus personagens no subúrbio carioca com uma visão positivista do cotidiano, o autor acionou mecanismos psicossociais adormecidos, inclusive, em classes mais altas”, analisa o doutor em Teledramaturgia Brasileira e Latino-Americana pela USP, Mauro Alencar. “A isso podemos somar uma trama perfeitamente bem urdida, que flertou com outros gêneros como o cinema e o seriado; com personagens densos, humanos a ponto de tornarem-se adjetivos (caso do ‘Tufão’)”. “A direção cinematográfica, em tomadas e na fotografia, e a quebra de paradigma do folhetim tradicional: Avenida Brasil não tem como tema central uma história romântica, mas uma história de vingança, onde não existe o mocinho e o vilão, os personagens centrais não são maniqueistas como no folhetim tradicional” diz o escritor Nilson Xavier, autor do Almanaque da Telenovela Brasileira. E o Doutor em teledramaturgia pela USP, com tese recém-defendida sobre a construção do vilão nas telenovelas brasileiras, Claudino Mayer destaca: “O sucesso dessa novela se deve ao bairro do Divino, ele funciona independente da classe social, qualquer nível está representado ali”, aponta. “Cada um daqueles personagens trouxe um tipo que é uma representação dessa classe C que vem crescendo, são elementos de representação do povo brasileiro. O João Emanuel Carneiro conseguiu. Ele estava no momento certo, na hora certa. E olhe que é de elite, como é que consegue escrever assim sobre esta nova classe C?! Além do que, ele vem construindo a novela num ritmo que se aproxima do seriado”.

A meu ver a história do Brasil se não era uma novela acabou de se transformar. Como algo tão fútil como uma telenovela pode parar um país inteiro, e problemáticas sociais tão importantes podem ser facilmente esquecidas da noite para o dia. Em Roma, um dos maiores impérios da humanidade, o humorista e poeta romano Juvenal chamava o modelo de alienação e controle das massas de política do “Pão e Circo”. No Brasil só basta o circo. Está é a verdadeira avenida Brasil, o país que parou.

Um comentário:

Eder Lira disse...

Amigo Douglas.
Parabéns pelos artigos que fazem refletir sobre a nossa realidade. Pensar criticamente torna a sociedade mais intensa e com isso torna-a mais capaz de mudar a sua própria realidade..